Mediocridade e opinião pública
“Em boa verdade, independentemente de qualquer homenagem que se possa declarar, ou até prestar, à superioridade intelectual, real ou pretensa, a tendência geral no mundo é para tornar a mediocridade o poder prevalecente entre a humanidade. Na história antiga, na Idade Média, e num grau cada vez menor no decorrer da longa transição do feudalismo para o tempo presente, o indivíduo era em si um poder; e se tinha ou grandes talentos ou elevado estatuto social, constituía um poder considerável. Em política é quase uma trivialidade dizer que a opinião pública domina agora o mundo. O único poder digno desse nome é o das massas e dos governos – que se tornam o órgão das tendências e instintos das massas. Isto é tão verdade nas relações morais e sociais da vida privada como nas relações públicas. Aqueles cujas opiniões formam grande parte da opinião pública não são sempre o mesmo tipo de público: na América são a totalidade da população branca; na Inglaterra, principalmente a classe média. Mas são uma massa, isto é, uma mediocridade colectiva. E – o que constitui uma novidade ainda maior – a massa agora não toma as suas opiniões de dignitários do Estado ou da Igreja, de líderes proeminentes ou de livros. O seu pensamento é feito em nome deles por pessoas muito parecidas com eles, dirigindo-se a eles ou falando em seu nome, no calor do momento, através dos jornais. Não estou a queixar-me de tudo isto. Não defendo que algo melhor seja compatível com o presente estado medíocre do espírito humano. Mas isso não impede o governo da mediocridade de ser um governo medíocre. – quer nos seus actos políticos quer nas suas opiniões, qualidades e tons de espírito que fomenta – , excepto na medida em que os muitos soberanos se deixaram guiar (o que aconteceu nos seus melhores tempos) pelos conselhos e pela influência de um, ou de uns poucos, mais altamente dotados e instruídos. (…) Parece que quando as opiniões de massas de pessoas se tornaram ou se estão a tornar o poder dominante em todo o lado, o contrapeso e antídoto para essa tendência seria a cada vez mais acentuada individualidade dos que estão nos mais elevados cumes do pensamento. É especialmente nestas circunstâncias que indivíduos excepcionais devem ser incentivados, e não desencorajados, a agir de modo diferente das massas.”
John Stuart Mill, Sobre a liberdade, Cap. III
A opinião pública é medíocre? Temos algum tipo de responsabilidade epistémica?